Iphan completa 80 anos de atividade

Uma das mais longevas instituições públicas brasileiras e a primeira dedicada à preservação do patrimônio cultural na América Latina, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) completou 80 anos de atividade no dia 13 de janeiro. Defensor da cultura brasileira em seus tesouros edificados, na criatividade aplicada na arte, nos ofícios que se perpetuam, nos costumes e tradições, na história ancestral, o Iphan comemora oito décadas de atuação e projeta os próximos 80 anos.

 

“No Brasil, poucas instituições chegaram onde o Iphan chegou. De 1937 aos dias de hoje, muita coisa mudou. No Brasil e no Patrimônio. Nascido da mente privilegiada de intelectuais comprometidos com o futuro do país, o instituto consolidou-se e fortaleceu-se com ações corajosas, amplamente reconhecidas e respaldas pela sociedade, conquistando legitimidade e a aprovação da população brasileira e, simultaneamente, protegendo um gigantesco conjunto de bens materiais e imateriais. A pressão de preservar e recuperar o patrimônio, apesar da carência de recursos humanos e financeiros, é vivida pelo Iphan desde sua criação”, afirmou a presidente do Iphan, Kátia Bogéa, destacando que o desejo é de que esse aniversário seja um marco para a projeção dos próximos 80 anos.

 

Ao longo de sua trajetória, a política nacional de patrimônio foi expandida e se relaciona hoje com diversos campos como gestão urbana, gestão ambiental, direitos humanos e culturais – atuando desde o poder de polícia até a educação –, formação profissional e pesquisa, e crescente envolvimento internacional. O maior envolvimento do Iphan ressignificou sua existência e ganhou maior capilaridade, estando o instituto presente em 27 Superintendências Estaduais, 26 Escritórios Técnicos, dois Parques Nacionais e cinco Unidades Especiais.

 

Nesses 80 anos de atividade foram tombados 87 conjuntos urbanos (o que implica em cerca de 80 mil bens em áreas tombadas e 531 mil imóveis em áreas de entorno já delimitadas) e três estão sob o tombamento provisório. Nessas áreas, o instituto atua e investe recursos, tanto direta – na forma de obras de qualificação – quanto indiretamente – por meio de parcerias com outras instituições municipais e estaduais –, além do PAC Cidades Históricas e dos Planos de Mobilidade e Acessibilidade Urbana.

 

Além disso, o Iphan tem sob sua proteção 40 bens imateriais registrados, 1.262 bens materiais tombados, oito terreiros de matrizes africanas, 24 mil sítios arqueológicos cadastrados, mais de um milhão de objetos arrolados (incluindo o acervo museológico), cerca de 250 mil volumes bibliográficos e vasta documentação de arquivo.

 

Para Kátia, entre os desafios para os próximos 80 anos do Iphan estão a ampliação do quadro funcional e o de demostrar que o Patrimônio Cultural é um ativo para o desenvolvimento social do Brasil, estimulando a economia, gerando empregos e renda, impactando positivamente na autoestima dos brasileiros.

 

“As cidades brasileiras enfrentam inúmeros problemas. Muitos dos quais atingem diretamente os núcleos com valores patrimoniais, comprometendo as características que, ao longo dos anos, buscamos preservar, além da própria qualidade de vida dos cidadãos. Para reverter este quadro e continuar a cumprir com sua missão, o Iphan entende que é fundamental inserir as questões relacionadas com a preservação na pauta das políticas públicas prioritárias para o Brasil”, defende.

 

Atuação

 

Cerca de 40 mil imóveis estão localizados em conjuntos urbanos tombados, o que implica acompanhamento, autorização de intervenções e fiscalização; o licenciamento ambiental prevê a participação do Iphan visando minimizar impactos sobre o patrimônio cultural, o que representa mais de mil processos de licenciamento por ano, envolvendo desde as grandes obras de infraestrutura até intervenções urbanas de menor porte; a cada ano, são analisados cerca de 50 mil bens em processo de transferência, permanente ou temporária, para o exterior, visando o combate ao tráfico ilícito de objetos de bens de valor cultural. Com a extinção da Rede Ferroviária Federal, o Iphan, após 2007, tornou-se responsável pelo patrimônio ferroviário, presente em mais de 1.200 municípios, incluindo edifícios, bens móveis e acervos documentais.

 

O Iphan conta hoje com 1.090 servidores, dos quais apenas 696 compõem o quadro permanente, distribuídos em 27 Superintendências Estaduais, 26 Escritórios Técnicos, dois Parques Nacionais e cinco Unidades Especiais. Hoje, 46% dos servidores do Iphan possuem mais de 51 anos de idade e 27% encontram-se em abono de permanência. Dentro de cinco anos, 296 servidores terão condições plenas de se aposentar. Nesse sentido, caso não haja ingresso de novos servidores muito em breve, o quadro funcional do Iphan poderá ficar restrito a somente 224 servidores já em 2021.

 

História

 

Criado pela Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937, o Iphan nasceu como Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) dentro do Ministério da Educação e da Saúde, trabalhou arduamente em parceria com a União, os Estados, os Municípios, a comunidade e o setor privado, buscando apoio e investimento na ampliação de uma rede de proteção e valorização do patrimônio.

 

Os primeiros anos do Iphan foram voltados à sensibilização da população, quanto ao valor e à importância do acervo cultural representado pelos edifícios que compunham os núcleos tombados e pelos bens móveis neles existentes, com o desejo de proteger o que fosse possível, principalmente os bens excepcionais de “pedra e cal”, ou seja, a arquitetura monumental e as chamadas cidades históricas. As ações levaram o órgão a alcançar significativo prestígio internacional e deixaram como legado um volumoso número de bens culturais salvos do desaparecimento.

 

Nos anos heroicos, quando a instituição foi dirigida pelo advogado Rodrigo Melo Franco de Andrade, cabia proteger aquilo que se entendia por patrimônio histórico e artístico nacional, numa tarefa ou obra civilizadora de reconhecimento e afirmação de uma identidade nacional.

 

Na década de 1970, discutiu-se muito a relação entre o turismo e patrimônio e em 1980, quando o designer Aloísio Magalhães assumiu a direção da Fundação Pró-Memória, houve uma grande inflexão conceitual. Aloísio usou sua experiência no Centro Nacional de Referência Cultural, introduzindo um viés antropológico na instituição. Hoje, é possível afirmar que ele substituiu o patrimônio histórico e artístico de Rodrigo, pela noção de bens culturais. Se, até então, o Patrimônio trabalhava com as ideias de “civilização” e “tradição”, passou a considerar as noções de “desenvolvimento” e “diversidade cultural”.

 

Tal mudança desembocou nas discussões para a elaboração da Constituição Federal (CF) de 1988, que representou um avanço para o campo do Patrimônio. De 1982 a 2006, treze personalidades sucederam-se na presidência do Iphan, de modo que os avanços da CF só começaram a ser respondidos em 2000, com o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial; e em 2009, com a Chancela da Paisagem Cultural Brasileira.

 

A partir de 2006, o Iphan esteve sob a presidência do arquiteto Luiz Fernando de Almeida. Período em que a Instituição vivenciou o seu terceiro grande momento conceitual, desta vez baseado nas noções de “Território” e “Políticas Públicas”. De um lado, buscando ampliar o número de bens protegidos (representando condignamente e em todos os recantos do país, a riqueza e a diversidade dos bens culturais do Brasil); e de outro, reposicionando o patrimônio cultural brasileiro no rol dos assuntos estratégicos para o futuro do país. Ou seja, o patrimônio encarado como um direito de todo o povo brasileiro.

 

Ao longo desses 80 anos, o alargamento do sentido do patrimônio, na mesma direção do ocorrido com a política cultural como um todo, passou a requerer que a proteção do Estado se estenda desde um sítio urbano complexo e dinâmico como o Plano Piloto de Brasília (DF), até à pequena casa de madeira povoada de objetos de uso cotidiano do seringueiro Chico Mendes, em Xapuri (AC); da salvaguarda dos modos de fazer tradicionais relacionados ao manejo de alimentos ou recursos naturais, como o Ofício das Paneleiras de Goiabeiras; de celebrações como o Círio de Nazaré ou a Festa do Bonfim; ou de expressões como o Frevo, a Roda de Capoeira e a Arte Kusiwa dos índios Wajãpi.

 

Espaços de reprodução das matrizes africanas, práticas religiosas, que representam a luta e a resistência do povo negro no Brasil, os terreiros de matrizes africanas também ganharam o reconhecimento do Iphan como Patrimônio Cultural Brasileiro. Em 1986, foi tombado o Terreiro da Casa Branca, em Salvador (BA), o precursor. Nas duas últimas décadas, foram protegidos outros oito terreiros. A política de valorização e reconhecimento das práticas religiosas trabalha, desde 2009, de forma articulada com a Secretaria de Políticas e Promoção da Igualdade Racial (Seppir) e a Fundação Cultural Palmares (FCP).

 

Nos últimos 16 anos, graças a criação da política e do Registro do Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro (Decreto 3551/2000), mais do que conferir títulos, foi declarada a responsabilidade do Estado com esses bens. Na sequência da política do patrimônio imaterial, agregou-se a valorização da diversidade linguística. O Brasil, que em mais de 500 anos, tem como língua oficial o português, possui falantes de mais de 180 línguas indígenas, algumas línguas de imigração hoje desaparecidas nos seus países de origem e remanescentes de línguas africanas. É o caso, por exemplo, das línguas indígenas Asurini, Guarani Mbya e a de migração Talian, reconhecidas como Referência Cultural Brasileira.

 

Desde 2013, o Iphan conta com recursos para o desenvolvimento de suas ações e a execução do PAC Cidades Históricas, que é de sua responsabilidade. Nesta realidade, a Lei Orçamentária prevê para o ano de 2017 o valor aproximado de R$ 18 milhões para aplicação pelo Iphan em ações diversas, além de R$ 250 milhões para o PAC Cidades Históricas.

 

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